inSight
XVI
às vezes, falo-te pouco de mim.
não é de propósito, mas tenho sempre tantas coisas para contar.
e conto, conto, conto... e só entre meias palavras me vais apanhando.
ainda bem que estás sempre tão atenta!
XV
já tenho os brinquedos arrumados.
a caixa encostada a um canto.
limpei-lhes o pó. mirei-os bem. gosto deles assim estragados pelo uso. com pequenas falhas de tinta, aqui e ali um bocado do material arrancado.
vou sentar-me à tua frente e falar tranquilamente.
de hoje em diante, será assim:
um caminho directo
à procura do fim.
XIV
quando saltar do baloiço
conseguirei ter os pés em terra firme?
conseguirei largar o caderno, onde aprendi a escrever as primeiras letras?
XIII
não sei o papel que tenho
nem sei que lugar devo ocupar.
hoje sou tudo e sou nada.
e sinto-me tão baralhada!
XII
é branco é vermelho é cinzento
é uma mistura, algo disforme, o sentimento que trago hoje em mim
XI
tento manter a cabeça à tona.
o turbilhão é tão grande
que o corpo cede.
se conseguir respirar
renovar o oxigénio
talvez me aguente.
X
gosto de me ver ao espelho.
mas hoje estou demasiado cansada para olhar para mim.
IX
se me deixar levar,
vou acordar
ou adormecer?
VIII
fiquei à espera que, com o decorrer do tempo, algo me iluminasse.
o relógio não parava. não parou.
as banalidades a saírem pela boca fora, sem controle aparente,
e eu a sentir-me tão estúpida por perder tempo com aquilo!
mas sem conseguir contrariar.
VII
quando subir as escadas já estarei a desfalecer.
irei diluir-me no vão da escada, escorrer pela alcatifa, até que ao sofá chegará somente
um pingo
uma nódoa
VI
nem me apetece imaginar, quanto mais concretizar.
é preguiça? é sofrimento?
não me apetece.
ainda assim, acho que te vou visitar.
não consigo assumir uma desculpa suficientemente boa para não ir.
V
um amor atrevido so o é, porque nos liberta.
é aquele que nos leva, com pudor e cerimónia, a ultrapassarmos a nossa timidez.
que nos permite ousar contemplar, ainda que de soslaio, o objecto do anseio.
que nos solta margaridas da boca, pétalas que caem, uma a uma, mesmo que tibuteantes.
nunca é aquele que nos faz ser inconvenientes. directos. crus.
IV
a culpa, por muito que a enxotes,
essa, às vezes
morde!
III
não encontrei ferrão com que te ferir.
fui branda no abandono.
hoje, ainda procuro libertar-me do lixo que trouxe.
tivera eu presente a razão nessa hora, e hoje serias paisagem.
assim, és um insecto.
II
n
e
m
arrancadas
a ferro,
elas saem!
I
dois sofás. uma mesa com cadeira. uma estante com livros. uma mesa entre os dois sofás, dipostos em ângulo recto. um candeeiro. um cinzeiro.